sexta-feira, 30 de setembro de 2011

DÍADE: MÃE E FILHO PORTADOR DE NECESSIDADES EDUCATIVAS ESPECIAIS

Iara da Silva Machado*
É denominada díade o período que vai da fecundação até os 3 anos de vida; corresponde a “era da mãe”, da díade mãe-filho, que se caracteriza por fortes laços afetivos e uma certa distância e isolamento do meio circundante (Griffa & Moreno, 2001). Existem muitas abordagens que interpretam esta relação dual, dentre elas a que afirma através de pesquisas, que a privação do bebê do contato materno ou de substitutos adequados gera quadros clínicos de ‘privação emocional parcial ou depressão anaclítica’ e ‘privação emocional total ou marasmo emocional’.
O quadro de privação emocional parcial estabelece-se quando os bebês têm um bom vínculo materno até por volta do sexto mês, e ficam privados dele por cerca de três meses; o quadro de privação emocional total dá-se quando os bebês são privados do convívio materno nos primeiros meses de vida por período maior do que cinco meses, independente do mal ou bom relacionamento materno anterior.
Muitas vezes, esquecidos que a mãe de hoje foi filha ontem, e não há como apagar os registros bons e maus dessa vivência, e que no ato da maternidade existe o momento de atualização do Ser nos campos tanto do potencial hereditário, quanto dos aspectos afetivos, emocionais, psíquicos, pessoais, sociais e ambientais, portanto Winnicott (2002) considera conveniente usar a expressão do tipo ‘ mãe suficientemente boa’ para transmitir uma concepção não idealizada da função materna. Quando o foco é o bebê encontra-se uma visão oposta ao campo materno que é a valorização total da inaptidão deste para lidar com a vida, ele não possui nada de experiência ou vivência anterior, não tem condições de organizar um pensamento e expressar o seu desejo oralmente, de caminhar, de alimentar-se, vestir-se, conduzir-se, enfim é aquilo que Winnicott (2002) ainda chamará apropriadamente de um ser portador de dependência absoluta, pois este possui uma condição de dependência total em relação ao meio.
Ainda para Navarro (1984) o stress na vida embrionária atinge os genes. Na vida fetal, através da mediação da mãe, o stress atinge principalmente a pele, o aparelho auditivo e circulatório. O feto pode ter uma simpaticotonia (resposta autônoma) induzida pela mãe. O recém-nascido está sempre exposto ao stress que atinge os cinco sentidos: tato, visão, audição, olfato e paladar.
Miller (1995) apresenta no viver e crescer com crianças que têm necessidades educativas especiais uma visão enriquecida dos filhos, reconhecendo que ninguém é perfeito descreve a partir da díade mãe-filho quatro fases de adaptação da realidade objetiva de se ter no lar uma criança com deficiência sensorial ou mental, na elaboração do luto do filho ‘perfeito’. Essas fases são denominadas de:
  • Sobrevivência: quando se observa que algo saiu do controle, e que a partir desse fato inusitado deve-se reagir e enfrentar o porvir. Os sentimentos nesta fase incluem o medo, a confusão, a culpa e a vergonha.
  • Busca: consiste em procurar um diagnóstico e serviços de saúde, seguidos de uma série de questionamentos como: Por quê? O que isso significa na minha vida?
  • Ajustamento: é uma mudança de atitude frente ao processo do viver. A mãe passa a reconhecer que a sua vida também inclui os outros filhos (se houver), o companheiro, a parentela, o trabalho (talvez) e os amigos. É uma etapa que mostra a mãe sua capacidade de desenvolver novas habilidades para lidar com o filho portador de necessidades educativas especiais.
  • Separação: é a crença paulatina na possibilidade de ir-se ‘soltando’ o filho, para que ele possa desenvolver suas próprias habilidades e potencialidades. Afinal, o nascimento é o primeiro marco de uma grande viagem para a separação/independência. Vive-la junto a uma criança especial é um desafio enorme para os pais, porque o que para uma criança ‘normal’ é um fato extremamente previsível e banal, como por exemplo, o ato de calçar uma meia ou pronunciar a palavra mamãe, para uma criança portadora de limitação mental ou surda isso será um desafio vencido, aplaudido e avalizado pela mãe e pai como uma vitória.
Lowen (1985) afirma que o prazer é uma resposta corporal. A capacidade para o prazer é uma função da vitalidade do corpo, ou seja, de quão vibrantemente vivo está o corpo.
Quando se fala da díade mãe-filho a ligação corporal é primária, reconhecer a importância da vinculação dos corpos é reflexo dos processos anteriores estruturados, ou seja, o corpo inscreve e reflete o que se passou no campo dos pensamentos/impressões e sentimentos/emoções, e esta qualidade permeará o Ser por toda a vida.
Reconhecendo os trabalhos das terapêuticas corporais cremos neles enquanto caminhos para a educação da pessoa portadora de necessidades especiais, no campo da afetividade expressa pelo corpo, naquilo que descrevemos como linguagem corporal afetiva.
Existem possibilidades criativas de se vivenciar essa relação proximal, para fins de uma estruturação emocional pautada nas impressões sensoriais. A capacidade de tocar e transmitir pelo calor e pela suavidade o quanto o outro é significante para nós imprimindo pelo tato a aceitação da identidade corporal; o olhar para o outro enternecido alimenta o globo ocular de energia calorosa e amorosa ajudando este a espelhar a alma.
Lowen (1982) diz: que para se alcançar um nível de integração real consigo mesmo o homem deve começar sendo o próprio corpo, e deve finalizar sendo a palavra, mas a palavra deve vir do coração.
Ora, qual é a linguagem do coração, senão o afeto?!
 
*Trechos da monografia de pós-graduação apresentada por Iara da Silva Machado em 2004, na Faculdade de Ciências Sociais e Aplicadas, sob o título original: Desenvolvimento Social e a Linguagem Corporal Afetiva na Criança Portadora de Surdez.

quinta-feira, 29 de setembro de 2011

JOVENS INFRATORES & EDUCAÇÃO INTEGRAL

Iara da Silva Machado*
O processo de educação de um ser humano demanda muito trabalho e dedicação exaustiva. Muitas famílias perguntam-se onde começa a possibilidade de ter-se perdido o “fio condutor” no ato contínuo de educar um filho. Não existe uma resposta formatada que justifique ou determine precisamente a saída de um jovem de um pólo aceitável para uma conduta transgressora, mas vários estudiosos apontam para fatores que envolvem aspectos genéticos; distúrbios na constelação familiar; influência ambiental e social negativa e violenta; falta de religiosidade; dentre outros.
Em desdobramento, cada um desses fatores apresenta outros pontos que tecem a teia do sentimento de exclusão e, portanto de sensação de invisibilidade social daqueles que cometem infrações de várias ordens.
A educação integral focaliza o desenvolvimento do ser humano nos níveis biológico, ambiental, social, emocional, afetivo, cognitivo, psicológico e espiritual; em todas as fases do crescimento humano, isto é, infância, adolescência, maturidade e velhice.
De forma específica, a adolescência é a fase de avaliação de valores, crenças e atitudes adquiridas na infância, é o momento em que o jovem põe à prova suas concordâncias e discordâncias do que lhe foi passado no seio familiar. É o período da auto-afirmação da personalidade, reconhecida pelos especialistas do comportamento humano, como o período de prepotência juvenil (Griffa & Moreno, 2001).
Logo, se nas etapas antecedentes à adolescência houver memórias de maus tratos, dependências químicas na família, abandono emocional, violência doméstica com abusos físicos, verbais e psicológicos por parte dos pais ou responsáveis pela criança, excessos de coisas materiais como compensação pela ausência dos cuidadores – favorecendo a falta de limites na relação pais e filhos sinalizam fatores que podem impulsionar atos transgressores na vida juvenil.
Do ponto de vista psicológico, uma das facetas da verdade daquele que delinqüe é o desejo de uma punição, conseqüência ou limite, através de uma ação “antinatural”, mas que leva a mensagem de que ele precisa ser visto e contido, mesmo que seja pela visão do social negativo. O que favoreceu, talvez, o dito popular: “que falem mal de mim, mas falem algo.” É a busca do sentimento de pertencer de modo inadequado, distorcido e patológico.
Quando a mídia veicula filmes com as polaridades do tipo: vilão e herói; bem e mau; santa e bruxa, imediatamente nos identificamos com um dos lados e negamos ou abominamos o outro lado. O rejeitado em nós caracteriza uma sombra social, de modo que, toda sorte de criminalidade é a negação de um dos pólos dentro da consciência humana.
Assim, quando um jovem comete qualquer delito é uma parte machucada dele, seja no eixo familiar, afetivo, social, psico-orgânico... que está gritando por socorro, solicitando uma orientação assertiva e segura para possibilitar o resgate do brilho que foi mutilado no ser humano em algum lugar do seu passado.



*CRP13/2262. Especialista em Psicologia Clínica; Especialista em Psicologia da Infância e Adolescência; Psicoterapeuta Corporal para Pessoas Surdas; Psicoterapeuta em Análise Bioenergética; Psicóloga Transpessoal; Aconselhamento a Dependentes Químicos; Formação Internacional em DMP – Deep Memory Process (Por Roger Woolger).

terça-feira, 27 de setembro de 2011

CURIOSIDADE JUVENIL: UMA ARMADILHA PSÍQUICA PARA O USO DE DROGAS

Iara da Silva Machado
O ser humano vive várias fases de desenvolvimento ao longo da sua existência, desde a vida intra-uterina até a terceira idade, muitos lutos físicos, emocionais e mentais se processam e interferem em diversos contextos de atuação da pessoa, do familiar, afetivo, social, educacional, ambiental, econômico, cultural até o religioso.
Nesse processo muitos pais e cuidadores se preocupam com o crescimento do filho, a partir da resposta de rendimento escolar, ou seja, o âmbito educacional é maximizado, esquecendo-se muitas vezes de avaliar e analisar os outros contextos, isto é, o todo.
Içami Tiba, médico psiquiatra e psicoterapeuta, no seu livro intitulado: Adolescentes - Quem Ama, Educa, chama à atenção para o exercício de perceber que o adolescente estagia numa fase que metaforicamente poderia ser comparado aos “monumentos de deuses com pés de barros; chega à água, e os vai desmoronando”.
O adolescente é uma pessoa com uma personalidade não amadurecida, daí a prepotência do período juvenil, ele ainda não distingue bem entre a palma da mão e os dedos. Muitas vezes ele acha que o dedo vale mais que a palma da mão: é quando um detalhe – um dos dedos – acaba com o todo.
A curiosidade é um atributo do ser humano e naturalmente é importante para a evolução da espécie, mas ela pode ser também instrumento de queda moral, com conseqüências desastrosas para toda uma vida.
Deusimar Guedes, advogado e psicólogo social, em seu livro DROGAS: Problema meu e seu, traz a informação de que a faixa etária mais atingida pelas drogas é exatamente aquela compreendida entre os 12 (doze) aos 30 (trinta) anos de idade; embora nos últimos tempos existam muitos casos de crianças se envolvendo com essas substâncias. Ele ainda afirma que a maioria desses jovens são levados as drogas por simples curiosidade ou influência do grupo a que pertencem.
Ainda afirma que a curiosidade é muito aguçada nos jovens. É um processo natural nesta faixa etária. E quando esta curiosidade direciona-se no sentido de se sentir impulsionado para experimentar o efeito ou sensações provocadas pelas drogas, muitas vezes o jovem é levado ao uso abusivo ou até mesmo à dependência. Infelizmente, embora seja certo afirmar que ninguém usa droga com a intenção de se tornar um dependente, muitos são traídos pelo próprio organismo que poderá ter uma pré-disposição genética à dependência, haja vista que de “12% a 15% da população mundial é fisicamente predisposta à dependência química da quase totalidade das drogas” (Guedes citando Vespucci, 2009).
Logo, se faz urgente que a família assuma o seu papel primordial de orientadores de almas para que a droga com todo seu atrativo inicial, de prazer efêmero e profundas ilusões de poder e liberdade, não atinjam os nossos lares, pois que na atualidade a oferta variada de inúmeras substâncias psicoativas que provocam dependência física, psicológica e social não vem de estranhos e indivíduos marginalizados, no mais das vezes, são oferecidos por amigos e afetos próximos e de total confiança.
Se os pais não buscarem um caminho para o diálogo franco, saudável e freqüente com seus jovens, a fim de estabelecerem contínuo processo de confiança e amor, correrá o risco de está delegando esses cuidados a terceiros que aguçando a curiosidade natural do adolescente poderá envolvê-lo numa armadilha psíquica sem volta à luz de uma vida com plenas possibilidades de realização e relativa felicidade.

Pensemos nisso!


segunda-feira, 26 de setembro de 2011

AMOR DE PAI

Por Iara da Silva Machado

Pai pode ser que daqui a algum tempo haja tempo prá gente ser mais
Muito mais que dois grandes amigos
Pai e filho talvez...
Pai senta aqui que o jantar está na mesa
Fala um pouco sua voz está tão presa
Nos ensina esse jogo da vida
Onde a vida só paga prá ver...
Pai você foi meu herói, meu bandido
Hoje é mais muito mais que um amigo
Nem você, nem ninguém está sozinho
Você faz parte desse caminho
Que hoje eu sigo em paz
Pai...Paz!

Esses trechos retirados da música intitulada PAI, do cantor e compositor brasileiro Fábio Júnior traz uma reflexão interessante sobre os caminhos que percorrem a mente humana quando se trata do arquétipo do PAI.
A figura de pai na cultura ocidental tem uma forte relação com a segurança, o reconhecimento pessoal, a força de impulso para construções pessoais e sociais e naquilo que se denomina realização: o indivíduo realizado intelectual, material e afetivamente.
A carga emocional de responsabilidades atribuídas à figura paterna é alta, mas nessa letra de música o autor desmistifica a imagem do pai poderoso e infalível, para um ser humano com limitações e potencialidades.
Quando o pai é um herói?
Quando um pai é um bandido?
Na simbologia psíquica o Herói é aquele que salva, protege e acerta sempre. É a representação do BEM, o Bandido é aquele que maltrata, afeta negativamente e erra sempre. É a representação do MAL. O problema da simbologia é o extremismo do sempre. Ora, não há uma só pessoa no mundo que possa afirmar sem correr o risco de errar de que alguém possa ser completamente bom ou completamente mau.
O convite reflexivo para avaliar o lugar do pai na vida humana, sobretudo nas fases de infância e adolescência é de ajudar esses pequeninos a reconhecerem a humanização do PAI, dar para esses homens um lugar mais próximo da verdade: seres que erram e acertam; portadores de sentimentos e emoções positivas e negativas e, sobretudo que apesar de amarem os filhos, haverá momentos em que fatalmente irão decepcioná-los, simplesmente por serem aprendizes da vida como qualquer pessoa.
Se exercitarmos essas possibilidades, poderemos suavizar as cobranças de ambos os lados nas famílias, no pólo dos filhos e no pólo dos pais: isso se resume em aceitação. Treinar essa compreensão para que o fluxo de amor do pai possa manifestar-se de modo mais leve e, portanto mais livre.
Que os pais possam permitir que os filhos lhes vejam nos campos da emoção e da razão, construindo intimidade para que a amorosidade faça parte do cotidiano familiar, favorecendo mais proximidade e convivências mais alegres.

Para o site: criancapb.


SOLICITAÇÃO DA ESTUDANTE DE JORNALISMO DA UNIMEP: CARLA BOVOLINI

MATERIAL PARA REVISTA PAINEL

1 – Na sua opinião, qual o motivo do gênero de terror ser tão popular e bem recebido pelo público de cinema?

Resposta: O ser humano é um complexo imenso de aspectos que estão relacionados ao campo genético, sócio ambiental, afetivo, cognitivo, cultural, psicológico, moral, político e religioso. De tal forma que não seria adequado filtrar ao ponto de reduzir as escolhas a apenas um desses eixos de estrutura comportamental. Porém, é possível que o gênero de terror remeta o indivíduo a um dos seus principais arquétipos ou memórias primárias, que é o medo. Por ser a energia do medo a mais primitiva e instintual sinalização de conservação, em termos filogenéticos buscar esses campos de atração fortalece a percepção do quanto de superação é possível agregar a personalidade. Poderia refletir uma forma de atualização da capacidade de sobrevivência à ameaça, simbolizada no filme de terror.

2 – Existe realmente algum tipo de ligação que pode ser feita com os medos que as pessoas têm e o que se retrata na tela?

Resposta: Fazendo a conexão com a resposta anterior, do ponto de vista arquetípico, sim. Considerando que dentro do gênero de terror existem as suas próprias subcategorias, do tipo: terror cômico (Exemplo: Pânico), terror psicodramático (Exemplo: Psicose), terror épico (Exemplo: Drácula o príncipe das trevas), terror romântico (Crepúsculo), etc.
Dessa forma, o imaginário pode conter campos de desejo da pessoa real, portanto, também os medos presentes na história antropológica do ser humano, desde o medo da dor até o medo da morte.

3 – Durante a coleta de dados para a matéria, percebemos que os filmes de terror marcam gerações, e que a preferência nas locadoras por títulos de horror de cada pessoa é na maioria das vezes orientada a partir dos filmes de terror que marcaram a infância ou adolescência. Refletindo a partir dessa informação, pode-se dizer que gerações diferentes têm medos diferentes?

Resposta: Compreendo que o medo é uma energia primária de sobrevivência física, que reflete e pode gerar seqüelas no nível cognitivo e emocional, logo, qualquer contexto que ameace a integridade física e emocional do indivíduo em qualquer época mobilizará o medo. Daí, os fatos históricos podem fazer uma correlação com essa manifestação, por exemplo, no período de guerra o medo mais presente é o de aniquilamento; no pós-guerra o medo pode voltar-se para o eixo da falta de autonomia, e assim por diante, que potencializado nas imagens de um cinema podem insinuar perfil de gerações, mas os medos em si não poderiam ser descritos como circunscritos somente naquela instância, eles podem aparecer simultaneamente em outro momento histórico.

4 – No gênero de terror há personagens que são recorrentes: espíritos, serial killers, zumbis, vampiros. Por trás das caricaturas retratadas no cinema existe algum significado social nos personagens dos filmes de terror?

Resposta: Naturalmente. As imagens utilizadas no cinema nasceram de fatos reais ou do lendário popular, de tal forma que várias dessas imagens foram objetos de estudo de conceituados pesquisadores do comportamento humano, que buscaram desde explicações através dos mitos, sonhos, costumes, gestos, formas, figuras, cores até números, como o Carl Gustav Jung, Jean Chevalier, Alain Gheerbrant e outros.
Os vampiros, por exemplo, muito difundidos na Rússia, Polônia, Europa Central, Grécia e Arábia representa o tormento da perda da vitalidade do indivíduo diante de seus conflitos de várias ordens que pode minar sua autonomia tornando-o um parasita (sugador) social. O lado positivo do mito é que ele representa o apetite de viver, o negativo é que ele vai buscar a força no outro e não em si mesmo. Assim ele representa em análise mais profunda uma inversão das forças psíquicas contra o próprio ser.  
Assim, a intencionalidade simbólica do filme de terror pode conter o resgate da memória da sombra (lado rejeitado e negado do humano) através da travessia pelo pântano do medo para acessar a força, a superação, a luz na escuridão, na integração da sombra à luz.
Poderíamos dizer que psiquicamente o terror pode representar o caminho do inferno interno que o humano precisa fazer para chegar ao cerne da sua luz.

Iara da Silva Machado.
Especialista em Psicologia Clínica – CRP13-2262
Psicoterapeuta em Análise Bioenergética
Psicóloga Especialista em Infância e Adolescência
Especialista em Atendimento a Pessoa Surda – SUVAG/UFPB/CAMPUS I
Aconselhamento e Orientação a Dependentes Químicos
Psicóloga Transpessoal
Psicóloga com formação internacional em DMP - Deep Memory Process





domingo, 25 de setembro de 2011

UM CONVITE DA PAZ: TRANSFORMANDO A DOR EM FLOR!

LEMBRANÇAS DE UMA MÃE
Por: Iara da Silva Machado

Amada filha Raiza,

Revendo nossa história, tal como um filme lembro sua chegada, quando a enfermeira anunciou que pelo som do seu choro você iria ser cantora.
Ainda bebê quando lhe ofertava meu leite você conversava comigo pelo brilho do seu lindo olhar.
Quando nos primeiros passos, nas primeiras letras e palavras você falou VOVÔ, antes de enunciar: MAMÃE & PAPAI, senti que você já reconhecia o valor dos ancestrais mais velhos, e dali os honraria como o fez enquanto aqui esteve entre nós.
Ainda criança, dos 6 aos 13 anos segurava bebês nos braços em abrigo de crianças como se fosse “uma velhinha”, e vez por outra dizia que tal ou qual bebê gostaria de levar prá casa.
Por vários anos foi a “netinha” de bondosos amigos e amigas que visitávamos em caravana na Colônia Getúlio Vargas, onde a hanseníase afastava ainda aquelas almas de um convívio social. Ali estava você sentada ao colo de alguns deles com a alegria de quem veio doar-se.
Na juventude, linda jovem você se tornou!!! E em desabrochando vi durante dois anos seus olhinhos brilharem apaixonados por “FI”... E você viveu esse amor juvenil com todo direito e intensidade de quem deixa e de quem leva uma marca de alegria no coração.
Ao passar para faculdade de Serviço Social tinha o sonho de trabalhar em penitenciária e justificava: quero ajudar esses criminosos, assassinos, marginais, através do meu coração. Eu acredito mamãe, que o mundo pode ser melhor! Se eu não acreditar nisso como poderei ser uma boa assistente social? E completava o pensamento dizendo: Eu acredito que se deve dar condições para uma nova chance. E eu respondia feliz: Minha filha, eu tenho tanto orgulho de você!
Fechando os olhos posso vê nossas preces à mesa agradecendo o pão de cada dia...Vejo nossos evangelhos no lar toda semana e você lendo as passagens do novo testamento e comentando-as com sua firmeza e beleza...
O silêncio diante das confusões emocionais a sua volta e o respeito ao lugar de cada um, inclusive ao seu próprio direito de viver em paz lhe fez uma JOVEM GIGANTE NA DECÊNCIA, DIGNIDADE E VERDADE.
Você me fez uma pessoa melhor com sua passagem na minha existência e certamente na vida de muitos outros que aprenderam a lhe amar...
Honro sua forma autêntica de ser e sinto muito orgulho do empréstimo que Deus me fez permitindo que estagiasse como sua mãe aqui...
Minha filha, meu maior tesouro te devolvo à Casa do Pai com a consciência tranqüila do dever cumprido. Quero aprender a transformar a dor e a saudade em trabalho no bem como lhe prometi no passado.
Que Maria Santíssima lhe cubra, meu amor, com seu manto de luz, e de onde você está possa fazer brilhar mais ainda a sua luz, ajudando a nós outros que ficamos no aprendizado da falta incomensurável que sua presença física faz, a confiar que a providência divina não desamparará a nenhum de nós.
Hoje sei que a vida não nos separou, e sim nos tornou UMA, por que a energia poderosa do amor não cessa nunca. Então, filha da minha alma quero ficar na luz para que você sinta a luz. Quero está na paz para que você seja paz. 
Quero lhe devolver a Deus em profunda gratidão pelas inúmeras memórias e lembranças que levarei para sempre no meu coração da história de amor que compartilhamos.
EU TE AMO MEU BEBÊ!!! FIQUE BEM!!! RECEBA O MELHOR DO MEU SER!!!
UM DIA VAMOS NOS ENCONTRAR E SERÁ UMA CELEBRAÇÃO MARAVILHOSA, POR QUE AMBAS ENTÃO TEREMOS CUMPRIDO MAIS UMA TAREFA PARA NOSSA ELEVAÇÃO.
Você cantou realmente sua canção nesta vida, e o nome desta canção se chama: RENÚNCIA.
Vá para a luz, lá onde brilha o SOL é a sua morada!!!

Beijos da mamãe.


CARTA PARA RAIZA

Raiza meu amor!

Só hoje estou lembrando que nestes seus mais de dezessete anos de vida na terra eu nunca lhe escrevi uma carta. Assim resolvi me comunicar com você desta forma, talvez antiquada para o mundo atual onde as pessoas se comunicam com equipamentos eletrônicos de tecnologia moderna como: computadores portáteis, telefones móveis e similares. Mesmo assim insisto em escrever-lhe esta carta para lhe dizer coisas que o dito mundo moderno não nos dá tempo para dizer, pois os pais e mães da modernidade precisam trabalhar mais de uma dezena de horas por dia para suprirem seus desejos de consumo desenfreado imposto pelo capitalismo selvagem, onde o “TER” é bem mais importante que o “SER”, e assim as relações humanas, mesmo entre os familiares e entes queridos são sempre momentâneas e voláteis.
Desta forma, descrevo nesta carta algumas coisas que não tive tempo de lhe dizer.
Só agora percebo querida filha Raiza, quantos caminhos desta vida eu não pude lhe mostrar.
Porque você partiu tão cedo meu anjo? Dizem que foi Deus que a chamou para assessorá-lo lá no céu. Mas ele não me emprestou você para que eu pudesse educar? Diga pra Deus que apesar de eu ter lhe ensinado a não fazer uso abusivo de drogas, a respeitar o próximo, a escolher bem as companhias, a não dirigir antes dos dezoito anos, a jamais cruzar o sinal vermelho no trânsito etc, eu ainda não tive tempo de lhe dizer que, apesar de agirmos sempre de acordo com estes ensinamentos e amar o próximo, existem pessoas que desrespeitam o próximo, que abusam de drogas lícitas e ilícitas, que dirigem embriagados, que avançam o sinal vermelho, que atropelam e matam pessoas inocentes quando do retorno das suas orgias noturnas. Perdão minha filha, porque apesar de ter lhe feito acreditar que o mundo é dotado de mais trigo do que joio, no nosso Brasil, muitas vezes os trabalhadores responsáveis pela retirada do joio do meio do trigo falham, e consequentemente o bom e saudável trigo é injustamente destruído.
Perdão meu amor, por ter me esquecido de lhe advertir sobre a constante presença de ervas daninhas, mesmo num plantio de propriedade de Deus. Prometo que continuarei lutando para cumprir o que lhe ensinei e prometi, ou seja, a busca de um mundo melhor, mais justo e mais humano, onde o joio não continue destruindo e sufocando o trigo.
Devo dizer que não está sendo fácil, é uma luta desigual. Assim, já que você está ai no céu, fale com Deus, e diga-lhe que preciso de forças para enfrentar o momento mais triste da minha vida, pois além do luto da partida precoce de minha amada filha “caçula”, ainda tenho que manter o coração brando e não alimentar o sentimento de vingança tão presente em nós imperfeitos seres humanos, sentimento este muitas vezes alimentado pela sensação de injustiça reinante aqui na terra.
Nunca esqueça que te amo. Saudades sem fim.

Assinado: seu imperfeito e relapso pai aqui da terra.

PS: homenagem a minha filha Raiza, morta por um reincidente assassino do trânsito no dia 16.07.2011, em João Pessoa/PB.

Deusimar Wanderley Guedes
Psicólogo e advogado
deusimar.dwg@dpf.gov.br