Suely Caldas Schubert
A dolorosa
ocorrência da queda do avião da TAM, que ia de São Paulo para o Rio, causando a
morte de quase cem pessoas, traz novamente, de forma mais intensa e angustiosa
a pergunta: por quê? por que acontecem essas tragédias coletivas? Outras
indagações acorrem à mente: por que alguns foram salvos, desistindo da viagem
ou chegando atrasados ao aeroporto? Por que alguns foram poupados e outros
receberam o impacto da queda do avião em suas casas ou na rua?
Somente o
Espiritismo tem as respostas lógicas, profundas e claras que explicam,
esclarecem e, por via de conseqüência, consolam os corações humanos.
Para a
imensa maioria das criaturas essas provas coletivas constituem um enigma
insolúvel pois desconhecem os mecanismos da Justiça Divina, que traz no seu
âmago a lei de causa e efeito.
Ante
tragédias como essa mais recente, ou como outras de triste memória: o incêndio
do Edifício Joelma, em São Paulo; o incêndio no circo em Niterói; outros desastres
de avião; terremotos; inundações; enfim, diante desses dramáticos episódios a
fé arrefece, torna-se vacilante e, não raro, surge a revolta, o desespero, a
descrença. Menciona-se que Deus castiga violentamente ou que pouco se importa
com os sofrimentos da Humanidade. Chega-se ao ponto de comparar-se o Criador a
um pai terreno e, nesse confronto, este sair ganhando, pois zela pelos seus
filhos e quer o melhor para eles, enquanto que Deus...
O
Codificador do Espiritismo interrogou os Espíritos Superiores quanto às provas
coletivas, no item intitulado Flagelos Destruidores, conforme vemos em "O
Livro dos Espíritos", nas questões 737 a 741, que recomendamos ao
atencioso leitor.
Nos últimos
tempos a Espiritualidade Amiga tem-se pronunciado a respeito das provações
coletivas, conforme comentaremos a seguir.
Exatamente
no dia 17 de dezembro de 1961, em Niterói (RJ), ocorre espantosa tragédia num
circo apinhado de crianças e adultos que procuravam passar uma tarde alegre,
envolvidos pela magia dos palhaços, trapezistas, malabaristas e domadores com
os animais. Subitamente irrompe um incêndio que atinge proporções devastadoras
em poucos minutos, ferindo e matando centenas de pessoas, queimadas, asfixiadas
pela fumaça ou pisoteadas pela multidão em desespero.
Essa
dramática ocorrência, que comoveu o povo brasileiro, motivou a Espiritualidade
Maior a trazer minucioso esclarecimento, conforme narrativa do Espírito
Humberto de Campos, inserida no livro "Cartas e Crônicas" (ed. FEB),
cap. 6.
Narra o
querido cronista espiritual que no ano de 177, em Lião, no sopé de uma encosta
mais tarde conhecida como colina de Fourvière, improvisara-se grande circo, com
altas paliçadas em torno de enorme arena. Era a época do imperador Marco
Aurélio, que se omitia quanto às perseguições que eram infligidas aos cristãos.
Por isto a matança destes era constante e terrível. Já não bastava que fossem
os adeptos do Nazareno jogados às feras para serem estraçalhados.
Inventavam-se
novos suplícios. Mais de vinte mil pessoas haviam sido mortas.
Anunciava-se
para o dia seguinte a chegada de Lúcio Galo, famoso cabo de guerra, que
desfrutava atenções especiais do imperador. As comemorações para recebê-lo
deveriam, portanto, exceder a tudo o que já se vira. Foi providenciada uma
reunião para programação dos festejos.
Gladiadores,
dançarinas, jograis, lutadores e atletas diversos estariam presentes. Foi
quando uma voz lembrou: -"Cristãos às feras!" Todos aplaudiram a
idéia, mas logo surgiram comentários de que isto já não era novidade. Em consideração
ao visitante era preciso algo diferente. Assim, foi planejado que a arena seria
molhada com resinas e cercada de farpas embebidas em óleo, sendo reunidas ali
cerca de mil crianças e mulheres cristãs. Seriam ainda colocados velhos cavalos
e ateado fogo. Todos gargalhavam imaginando a cena. O plano foi posto em ação.
E no dia seguinte, conforme narra Humberto de Campos, ao sol vivo da tarde,
largas filas de mulheres e criancinhas, em gritos e lágrimas, encontraram a
morte, queimadas ou pisoteadas pelos cavalos em correria.
Afirma o
cronista espiritual que quase dezoito séculos depois, a Justiça da Lei, através
da reencarnação, reaproximou os responsáveis em dolorosa expiação na tragédia
do circo, em Niterói.
Uma outra
tragédia também mereceu dos Benfeitores Espirituais vários esclarecimentos.
Por ocasião
do incêndio do Edifício Joelma, em São Paulo, ocorrido no dia lº de fevereiro
de 1974, o médium Francisco Cândido Xavier, em seu lar, em Uberaba (MG),
ouvindo a notícia pelo rádio, reuniu-se em prece com quatro amigos, solicitando
auxílio dos Benfeitores Espirituais para as vitimas .
Atendendo
ao apelo apresenta-se o Mentor Espiritual Emmanuel e escreve, através do
médium, comovedora prece inserida no livro "Diálogo dos Vivos".*
Dias
depois, em reunião pública, na qual estavam presentes alguns familiares de
vítimas do incêndio do Joelma, os poetas Cyro Costa e Cornélio Pires
(Espíritos) manifestaram-se pela psicografia, ditando ao médium sonetos
referentes à tragédia.
O soneto de
Cyro Costa traz uma dedicatória e o transcrevemos, tal como está, no citado
livro "Diálogo dos Vivos" (cap. 26, pág. 150):
Luz nas
chamas
Cyro Costa
(Homenagem
aos companheiros desencarnados no incêndio ocorrido na capital de São Paulo a 1º
de fevereiro de 1974, em resgate dos derradeiros resquícios de culpa que ainda
traziam na própria alma, remanescentes de compromissos adquiridos em guerra das
Cruzadas.)
Fogo!...
Amplia-se a voz no assombro em que se espalha.
Gritos,
alterações... O tumulto domina.
No templo
do progresso, em garbos de oficina,
O coração
se agita, a vida se estraçalha.
Tanto fogo
a luzir é mística fornalha
E a
presença da dor reflete a lei divina.
Onde a fé
se mantém, a prece descortina
O passado
remoto em longínqua batalha...
Varrem com
fogo e pranto as sombras de outras eras
Combatentes
da Cruz em provações austeras,
Conquanto
heróis do mundo, honrando os tempos idos.
Na Terra o
sofrimento, a angústia, a cinza, a escória...
Mas
ouvem-se no Além os hinos de vitória
Das
Milícias do Céu saudando os redimidos.
Tecendo
comentários sobre o soneto de Cyro Costa, Herculano Pires (no livro
retrocitado), pondera que somente a reencarnação pode explicar a ocorrência
trágica. Segundo o poeta as dívidas remontavam ao tempo das Cruzadas. Estas
foram realizadas entre os séculos XI e XIII e eram guerras extremamente cruéis
com a agravante de terem sido praticadas em nome da fé cristã. Os historiadores
relatam atos terríveis, crimes hediondos, chacinas vitimando adultos e
crianças. Os débitos contraídos foram de tal gravidade que os resgates
ocorreram a longo prazo. Tal como o do circo em Niterói. O que denota a Bondade
Divina que permite ao infrator o parcelamento da dívida, pois não haveria
condição de quitá-la de uma só vez.
Vejamos
agora o outro soneto (cap. 27, pág. 155):
Incêndio em
São Paulo
CORNÉLIO
PIRES
Céu de São
Paulo... O dia recomeça...
O povo bom
na rua lida e passa...
Nisso,
aparece um rolo de fumaça
E o fogo
para cima se arremessa.
A morte
inesperada age possessa,
E enquanto
ruge, espanca ou despedaça,
A Terra
unida ao Céu a que se enlaça
É salvação
e amor, servindo à pressa...
A cidade
magoada e enternecida
É socorro
chorando a despedida,
Trazendo o
coração triste e deserto...
Mas vejo,
em prece, além do povo aflito,
Braços de
amor que chegam do Infinito
E caminhos
de luz no céu aberto...
A idéia de
que um ente querido tenha cometido crimes tão bárbaros às vezes não é bem
aceita e muitos se revoltam diante dessas explicações, mas, conhecendo-se um
pouco mais acerca do estágio evolutivo da Humanidade terrestre e do quanto é
passageira e impermanente a vida humana, a compreensão se amplia e aceitam-se
de forma mais resignada os desígnios do Criador. Por outro lado, que outra
explicação atenderia melhor às nossas angustiosas indagações?
Estas
orientações do Plano Maior sobre as provações coletivas expressam, é óbvio, o
que ocorre igualmente no carma individual. Todavia, é compreensível que muitos
indaguem como seria feita a aproximação dessas pessoas envolvidas em delitos no
passado. A literatura espírita, especialmente a mediúnica, tem trazido
apreciáveis esclarecimentos sobre essa irresistível aproximação que une os
seres afins, quando envolvidos em comprometimentos graves. A culpa, insculpida
na consciência, promove a necessidade da reparação.
O
Codificador leciona de forma admirável a respeito das expiações, em "O Céu
e o Inferno" (Ed. FEB), cap. 7 - As penas futuras segundo o Espiritismo.
Esclarece que "o Espírito é sempre o árbitro da própria sorte, podendo prolongar
os sofrimentos pela permanência no mal, ou suavizá-los e anulá-los pela prática
do bem".
Assim -
expressa Kardec -, as condições para apagar os resultados de nossas faltas
resumem-se em três:arrependimento, expiação e reparação.
"O
arrependimento suaviza os travos da expiação, abrindo pela esperança o caminho
da reabilitação; só a reparação, contudo, pode anular o efeito destruindo-lhe a
causa.
Este o
notável Código penal da vida futura, que tem 33 itens e que apresenta no último
o seguinte resumo, em três princípios:
"1º º
O sofrimento é inerente à imperfeição.
2º Toda
imperfeição, assim como toda falta dela promanada, traz consigo o próprio
castigo nas consequências naturais e inevitáveis: assim, a moléstia pune os
excessos e da ociosidade nasce o tédio, sem que haja mister de uma condenação
especial para cada falta ou indivíduo.
3º Podendo
todo homem libertar-se das imperfeições por efeito da vontade, pode igualmente
anular os males consecutivos e assegurar a felicidade futura.
A cada um
segundo as suas obras, no Céu como na Terra: - tal é a lei da Justiça
Divina."
__________
Suely
Caldas Schubert nasceu em Carangola, MG. Desde jovem, dedica-se às atividades
espíritas, especialmente no âmbito da mediunidade e da divulgação do
Espiritismo. (USE/Regional Jaú).
* XAVIER,
Francisco Cândido e PIRES, J. Herculano. Espíritos Diversos, cap. 25, p. 145,
1ª ed. da GEEM, São Bernardo do Campo (SP) - 1974. (Transcrita na página
seguinte.)
Revista
Reformador – ed. fevereiro de 1997
Nenhum comentário:
Postar um comentário