Iara da Silva
Machado
O
aprendizado da capacidade amorosa é o nosso reconhecimento da ignorância sobre
essa virtude grandiosa.
A
maior parte das criaturas se comporta como se o amor não fosse um sentimento a
ser cada vez mais aprendido e compreendido. Agem como se ele estivesse inerte
na intimidade humana e passam a viver na expectativa de que um dia alguém ou
alguma coisa possa despertá-lo em toda a sua potência, numa espécie de fenômeno
encantado.
A
amorosidade manifesta se torna fonte inesgotável de doação, por isso, se diz
que aquele que ama sempre tem algo para ofertar.
Confundimos
na qualidade de aprendizes a energia do amor com outras formas de atração e
paixão, chegando muitas vezes a negar o fracasso amoroso, durante anos e anos,
para não admitir diante dos outros nossas escolhas precipitadas e equivocadas.
Não
percebemos, muitas vezes, oportunidades imensas de caminhar pelas veredas do
amor, porque não renunciamos a necessidade neurótica de ser perfeitos, ficando
preso a uma pressão torturante de infalibilidade.
Perdemos
excelentes momentos de crescimento pessoal, queixando-nos cotidianamente de que
estamos sendo ignorados e usados, porém sem tomar atitude alguma. Deixamo-nos
magoar pelos outros e acabamos magoando também a nós mesmos. Reagimos as
ofensas ou indiferença, experimentando sentimentos de frustração, negação,
autopiedade, raiva e imensa mágoa. Culpamos as pessoas pelos nossos
sofrimentos, verbalizando as mais diversas condenações, e em seguida, esforçamo-nos
exaustivamente para não ver que a origem de nossas dores morais é fruto de
nossa negligência e comodismo.
Nós
nos “barateamos” quando colocamos nossa autovalorização em baixa na espera de
seduzir e modificar seres humanos que nos interessam.
Vivemos
comumente desencontros na área da afetividade, por desconhecermos os processos
psicológicos que nos envolvem, o que nos faz viver supostos amores.
A
paixão, que muitos chamam de amor, raramente atravessa seu estágio embrionário.
Aos poucos, perde a força motivadora por não possuir raízes profundas nos
verdadeiros sentimentos da alma.
Quando
a desilusão desfaz a paixão é porque desgastou-se o estado de irrealidade.
Paixões acontecem quando usamos nossas emoções sem ligá-las aos nossos sentidos
mais profundos.
Quase
sempre acreditamos que o fracasso conjugal é um antônimo do sucesso
matrimonial, esquecendo-nos, contudo, de que o êxito, em muitas circunstâncias,
está do outro lado do que denominamos ruína afetiva.
Aprendemos quem somos e
como agimos convivendo com os defeitos e qualidades dos outros. É justamente
nos conflitos de relacionamentos que retiramos as grandes lições para
identificar as origens de nossas aflições.
É
profundamente irracional nutrir a crença de que nunca seremos desapontados e de
que sempre seremos amados e entendidos plenamente por todos.
Portanto,
é importante admitir a mágoa, quando ela realmente existir, para que possamos
resolver nossos conflitos comportamentais.
A
maneira decisiva de atingirmos o equilíbrio interior é aceitarmos nossas
emoções e sentimentos como realmente eles se apresentam, pois, deixando de
ignorá-los passaremos a nos adaptar firmemente à realidade dos fatos e dos
acontecimentos que estamos vivenciando.
O
que não pode ser visto não pode ser mudado. Os mecanismos inconscientes dos
quais nos utilizamos para nos enganar são em grande parte imperceptíveis,
principalmente aqueles que não iniciaram ainda a autodescoberta do mundo
interior, através do autoaprimoramento espiritual.
Mágoa
não elaborada se volta contra o interior da criatura, alojando-se em
determinado órgão, desvitalizando-o. Mágoa se transforma com o tempo em rancor,
exterminando gradativamente nosso interesse pela vida e desajustando-nos quanto
a seu significado maior.
Sentimentos
não morrem; poderemos enterrá-los, mas mesmo assim continuarão conosco. Se não
forem admitidos, não serão compreendidos e, consequentemente, estarão
desvirtuando a nossa visão do óbvio e do mundo objetivo.
A mágoa nas relações sociais do âmbito
familiar ao trabalho, da vida na comunidade a ação religiosa, em todas as
esferas de ação do homem e da mulher pode ser vista e entendida como uma
mensageira da possibilidade de curar pontos cegos das convivências e
possibilitar o reencontro de almas para uma vida mais leve na alegria de viver
e na gratidão da existência.
Adaptado do livro As
dores da alma. Francisco Neto, HAMMED, 1998
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